quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Estudo critica Um Computador por Aluno


Relatório afirma que uso de laptops por crianças não melhora rendimento educacional, apesar de ter um pequeno impacto na capacidade cognitiva. Para os autores, é preciso investir em instrução para que a tecnologia surta efeito

Um recente estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) afirma que a adoção de computadores portáteis por alunos no âmbito do programa One Laptop per Children (OLPC), apesar de melhorar a capacidade cognitiva das crianças, não gera ganhos educacionais significativos. É a primeira vez que uma pesquisa investiga os resultados educacionais da iniciativa.
De acordo com o documento, feito com base em dados coletados no Peru, país mais avançado na adoção dos computadores, é preciso investir em um projeto pedagógico no qual as máquinas sejam instrumento e não finalidade. “Nossa sugestão é combinar a disponibilidade de laptops com um modelo pedagógico voltado para o alcance de resultados pelos estudantes. Nossos resultados sugerem que computadores, por si só, ao menos os oferecidos pelo OLPC, não melhoram os resultados em áreas curriculares.”
O OLPC é um programa idealizado pelo professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT) Nicholas Negroponte. Ele consiste na doação de um laptop especial, o XO, leve e compacto, a alunos da rede de ensino. A ideia é que as máquinas ajudem as crianças a desenvolver suas capacidades e, assim, colaborem para melhorar o nível de ensino. Planejados para custar US$ 100, os laptops têm custado mais do que isso. No Peru, por exemplo, saiu por cerca de US$ 245. O Brasil chegou a anunciar a adoção do programa com o nome de “Um Computador por Aluno” (UCA), sob responsabilidade do Ministério da Educação. A iniciativa, no entanto, não decolou, apesar da compra de 2.600 unidades. No mundo, cerca de 2,5 milhões de XOs estão em uso em 40 países.
O estudo do IDB foi feito em 319 escolas públicas rurais do Peru, país mais avançado na adoção do OLPC – cerca de 900 mil máquinas foram adotadas em 500 colégios desde 2007. Na comparação entre 210 instituições com laptops há mais de 15 meses e as sem, as notas de matemática dos alunos usuários do XO foram apenas 4% superiores aos sem computadores. Em línguas, elas chegaram a ser 3% piores. Ou seja, o desempenho é pouco afetado pelas máquinas.
Causas
Os autores também investigaram as causas do baixo impacto. Segundo eles, os computadores não cumpriram várias das promessas a eles relacionados. Não aumentaram, por exemplo, o tempo que as crianças gastam com tarefas relacionadas às escolas. “Sugere-se que a introdução de computadores aumenta a motivação (com o ensino), mas nossos resultados sugerem o contrário”, escrevem. 
Além disso, as máquinas, apesar de serem carregadas com mais de 200 livros, não influenciam os hábitos de leituras. Outra descoberta é que os laptops são mais usados com atividades de pouco efeito nos resultados educacionais, como processadores de textos, calculadoras, jogos e aplicativos de gravação de música e vídeo. “Isso pode ser explicado pela ausência de softwares diretamente ligados a matemática e línguas e à falta de instruções claras aos professores sobre como utilizar [as máquinas] para fins curriculares”, aponta o texto.
Apenas 30% das escolas receberam suporte pedagógico para o uso dos computadores, apesar de 71% dos mestres terem declarado que participaram de algum treinamento. 
Repercussão
O documento gerou reações na OLPC Association, organização que gerencia as vendas do “um computador por aluno”. Para a entidade, é preciso analisar os dados com cautela e não generalizá-los. 
“Em diversos países, vimos significativas melhorias no entusiasmo das crianças por aprendizado e um crescente otimismo pelo seu futuro”, afirma em blog (http://blog.laptop.org/2012/04/10/rodrigos-response-to-the-economist/) Rodrigo Arboleda, CEO da ONG. Ele ainda aponta como benefícios maior envolvimento dos pais com a educação dos filhos e aumento da motivação dos professores.
Arboleda lembra também que é preciso levar em conta o contexto da educação no Peru. Lá, muitas escolas não têm eletricidade e internet, e alguns professores precisam dar aulas a diferentes classes ao mesmo tempo. Além disso, a formação dos docentes em geral é fraca. Uma pesquisa feita em 2007 pelo governo peruano ilustra bem a situação: 62% dos professores do país não tinham capacidade de leitura equivalente ao esperado do Ensino Médio e apenas 5% das escolas eram conectadas à internet. “Dados estes desafios, milagres não acontecerão do dia para a noite. O progresso ocorrerá gradualmente ao longo de muitos anos”, analisa o presidente da ONG.
A mesma análise faz Oscar Becerra, ex-diretor de Tecnologias para Educação do Ministério da Educação peruano e um dos idealizadores do programa no país. “Um sistema educacional em má forma como o peruano precisará, em minha opinião, de 10 a 15 anos apenas para melhorar a qualidade de seus professores”, argumenta(https://edutechdebate.org/olpc-in-peru/oscar-becerra-on-olpc-perus-long-term-impact/). “Algo precisa ser feito nesse meio tempo. Achamos que dar às crianças acesso a uma tecnologia projetada como uma ferramenta para o aprendizado era dar um passo na direção certa. Não acredito que o tempo seja gasto com tecnologia, mas não é avaliando quanto mais matemática ou história as crianças aprenderam da forma tradicional que veremos o verdadeiro impacto.”
Nicholas Negroponte, idealizador do programa, busca ver o estudo com outros olhos. “Ele [o estudo] diz claramente: ‘estudantes demonstraram melhores capacidades cognitivas com o OLPC’”, escreve.
De fato, o relatório aponta benefícios do programa. Nos testes, os estudantes que usavam o OLPC apresentaram resultados de 9% a 13% superiores. “Quantitativamente, as diferenças são grandes”, ressaltam os autores. “Um cálculo rápido sugere que o impacto estimado na fluência verbal é de seis meses para as crianças”, exemplifica Pablo Ibarrarán, um dos responsáveis pelo estudo. Ele também destaca que o programa permitiu maior contato com tecnologias de informação e comunicação (TICs). O índice de posse de máquinas por aluno foi muito maior do que onde a iniciativa não chegou – 1,18 contra 0,12. A diferença demonstra que, sem programa, os alunos não teriam acesso à tecnologia.
Especialistas, no entanto, questionam a validade da adoção das máquinas no ensino de países em desenvolvimento e alertam para o impacto da constante evolução da tecnologia voltada para a educação. Se em 2005, quando foi lançada, a ideia de um laptop para cada criança parecia entregar o que havia de mais moderno no mundo da computação, hoje já se pensa na utilização de tablets e smartphones. “Pensando para frente, projetos de TICs para a educação precisam focar no alinhamento entre uma crescente gama de ferramentas, objetivos claros e metodologia de avaliação para garantir uma eficiência mensurável e considerar o custo-benefício da presença de medidas alternativas”,escreve. Amos Cruz, especialista em educação da Universidade de Maryland (EUA).
Data: 20 de abril de 2012
Autor: Marcelo Medeiros

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